Preparação para o parto: o que é, evolução e importância

O parto é um momento que pode gerar emoções muito diversas, numa miscelânea afetiva intensa. A sua antecipação também é geradora de diferentes emoções, como a ansiedade, o medo, mas também o entusiasmo e a exaltação. Por ser uma experiência tão nova, intensa e importante, é natural que as grávidas queiram preparar-se, o melhor possível, para este momento.

A preparação para o parto é algo que tem vindo a evoluir no próprio sistema de saúde, com mais recursos e orientações para como preparar para um parto. Atualmente, temos acesso a muito mais informação e recursos para podermos fazer a preparação para o parto. Mas o que é de facto a preparação para o parto? E como pode ser feita? Quais são os aspetos mais importantes? Estas são algumas das perguntas a que ajudaremos a dar resposta neste artigo.

É necessário preparação para o parto?

O parto, se pensarmos bem, é algo natural e fisiológico, para o qual o corpo da mulher está inevitavelmente preparado. Isto pode fazer-nos levantar a questão: então, preciso mesmo de me preparar para o parto?

A verdade é que esta resposta é relativa e a preparação para o parto não deixa de ser algo individual e particular, na medida em que depende daquilo que cada mulher precisa. Pode precisar de informação, de aumentar a sua confiança ou de alguma preparação do ponto de vista mais físico. Pode acontecer algumas mulheres não precisarem de muito, tendo já em si tudo aquilo que precisam, embora (ainda) não o saibam.

Antigamente, não havia possibilidade de preparação para o parto. Nascia-se como se sabia, como as circunstâncias permitiam e ditavam. O parto era algo totalmente intuitivo e instintivo e não se ensinava nada às mulheres.

Atualmente, dispomos de mais recursos e possibilidades no mundo de preparação para o parto, e isso tem as suas vantagens. Isso pode, sem dúvida, ter vantagens se nos permitir juntar ao instinto o conhecimento e informação, no sentido do empoderamento.

Origem e evolução da preparação para o parto

O conceito de preparação para o parto surgiu com o obstetra Grantly Dick-Read e a necessidade que se salientava era essencialmente a de recuperação do parto natural e, por consequência, a necessidade de preparação. Este médico defendia que o medo era a principal causa da dor no parto. Identificou a necessidade de eliminar o medo do contexto do parto, para se poder diminuir a dor. Desta forma, diminuir-se-ia a necessidade de intervenção no parto. Desenvolveu-se o método do parto sem medo, em que nas sessões se ensinava às mulheres o relaxamento e a respiração.

Em 1951, na União Soviética, o ministro da Saúde decretou que se facilitasse o método psicoprofilático para aliviar a dor no parto. Este método tinha três elementos: pedagógico, psicológico e fisiológico. Explicavam-se os mecanismos do parto e da dor, treinava-se a respiração controlada e o relaxamento ativo.

No final dos anos 70, no Reino Unido, Janet Balaskas começou a partilhar com outras mulheres o que ela chamou de “parto ativo”. Ela percebeu que a restrição de movimentos e a obrigatoriedade de manter a posição deitada eram prejudiciais ao processo instintivo de parir.

Assim, colocou a ênfase no movimento e o grito e manifestações vocais. O movimento gerado por Balaskas levou a uma alteração da forma como o método até então vigente via a dor, passando a considerá-la como um elemento natural e importante do processo do parto. Incentiva-se então a participação ativa da mulher nas mais variadas formas, desde a recolha de informação até às medidas de conforto, à respiração e à posição.

Em que consiste a preparação para o parto?

Como vimos, parir é um ato natural e fisiológico, além de altamente individual e único. Como tal, não se ensina a parir nem se deve olhar a preparação para o parto como uma receita ou procedimento padrão que todas as mulheres devem aprender. Em vez disso, a preparação para o parto deve ser encarada como uma forma de fazer chegar informação e conhecimento às mulheres e/ou casais.

A preparação para o parto é permitir que a grávida e/ou o casal compreendam melhor a fisiologia do parto e tenham acesso a informação que ajude a (re)adquirirem maior autoconfiança. Mulheres mais autoconfiantes e empoderadas têm, no geral, partos mais satisfatórios e um pós-parto vivido com maior tranquilidade.

A informação transmitida deve permitir-nos conseguir melhor sentir e escutar o nosso corpo e o nosso bebé, lendo os sinais e sabendo o que eles nos transmitem. A informação fidedigna permite tomar decisões responsáveis e informadas e fazer escolhas que façam sentido em cada caso particular.

A preparação para o parto em Portugal concretiza-se, geralmente, em cursos constituídos por várias sessões teórico-práticas conduzidas por profissionais de saúde, geralmente de enfermagem. Estes cursos existem no setor público, nos cuidados de saúde primários ou em hospitais, mas também no privado, em clínicas, por exemplo.

Importância da preparação para o parto

Quando engravidamos, muito do conhecimento e informação que temos acerca do parto advém de histórias que ouvimos, experiências que vão sendo partilhadas ou vivenciadas, e que nem sempre constituem uma boa amostra da realidade. O conhecimento baseia-se muitas vezes em relatos orais e muitas vezes focados em complicações obstétricas.

Quem nunca ouviu a história da prima ou da vizinha que teve aquela experiência quando estava grávida, ou os constantes conselhos sobre o que deve ou não ser feito que, por mais que queiramos filtrar, nos ficam a pairar na mente? Isto, aliado à inexperiência sobretudo presente numa primeira gravidez, pode gerar níveis elevados de insegurança, medo e ansiedade, e trazer consequências menos positivas para a experiência de parto e para a própria maternidade. Mesmo quando já não se trata de uma primeira gravidez, experiências de parto anteriores menos positivas podem influenciar e enviesar a perceção do parto.

Deste modo, a preparação para o parto pode ajudar a adquirir conhecimento e informação mais abrangente e fidedigna, ajudando a corrigir potenciais enviesamentos e a empoderar, diminuindo inseguranças e medos.

O objetivo dos cursos de preparação para o parto é promover o conhecimento e informação, o bem-estar, a segurança e a confiança das mulheres e/ou casais em relação à gravidez, parto, pós-parto e parentalidade. Estes cursos permitem, para além de esclarecer a grávida e/ou o casal através de conhecimento e informação, proporcionar um contexto de partilha, desmistificar informações enviesadas e fomentar o estabelecimento de vínculos afetivos precoces.

Saber é poder, e ter acesso a informação fidedigna e segura dá-nos poder, confiança e segurança, ajuda-nos a adotar comportamentos mais saudáveis, a sentirmo-nos mais preparados e a ter a capacidade para tomar decisões e a dar um consentimento verdadeiramente informado no momento do parto e do pós-parto. A estarmos mais preparadas para o que vai acontecer, sabermos o que queremos ou não para nós e como o podemos expressar, a conhecer os recursos que existem e a que podemos recorrer.

Que informações e conteúdos fazem parte?

Como referido anteriormente, a preparação para o parto não tem necessariamente de ter uma fórmula universal, uma vez que a melhor preparação é aquela que é ajustada às necessidades de cada grávida e/ou casal. No entanto, existem alguns pontos que podem ser referidos como centrais e que podem ser importantes quando falamos em preparação para o parto:

  • Conhecer a legislação relativa aos direitos da mulher na gravidez e parto;
  • Saber o que é um plano de parto / plano de nascimento e como pode ser elaborado;
  • Perceber melhor a fisiologia do parto e trabalho de parto;
  • Conhecer as alterações que ocorrem durante a gravidez;
  • Conseguir identificar os indicadores de bem-estar e normalidade durante a gestação e também os sinais de alarme ou alterações e saber o que fazer perante estes sinais;
  • Perceber como é feita a monitorização do bem-estar do feto durante a gravidez e durante o trabalho de parto, e também como é monitorizado após o nascimento o recém-nascido;
  • Conhecer os riscos associados à gravidez, parto e trabalho de parto e quais as práticas recomendadas para controlo destes riscos;
  • Saber adotar hábitos de vida saudáveis durante a gravidez e reconhecer o impacto negativo dos comportamentos de risco;
  • Perceber a importância de controlar eventuais problemas de saúde pré-existentes;
  • Compreender melhor a sexualidade durante a gravidez e pós-parto e ter informação que permita viver as mudanças nesta dimensão de uma forma mais saudável;
  • Conhecer os planos de vigilância de saúde na gravidez;
  • Saber os direitos laborais existentes na gravidez e amamentação;
  • Conhecer estratégias de gestão do stress;
  • Identificar as diferentes fases do trabalho de parto e qual a atitude recomendada durante as mesmas;
  • Conhecer as indicações para diferentes tipos de parto e as vantagens do parto normal;
  • Saber quais as indicações clínicas para a indução do trabalho de parto ou para a cesariana e quais os riscos destes procedimentos, quando aplicados sem indicação clínica; 
  • Conhecer e saber aplicar estratégias não-farmacológicas de controlo do desconforto e alívio da dor no trabalho de parto e parto;
  • Conhecer estratégias facilitadoras da evolução do trabalho de parto normal;
  • Conhecer as possíveis formas de analgesia;
  • Saber os benefícios da clampagem tardia do cordão umbilical e da administração da vitamina K ao recém-nascido;
  • Ter conhecimento sobre a recolha de células estaminais e compreender os seus benefícios e as limitações atualmente existentes:
  • Perceber os benefícios do contacto pele-a-pele e do início da amamentação na primeira hora de vida;
  • Saber realizar os principais cuidados de higiene e conforto ao recém-nascido;
  • Compreender os principais marcos de desenvolvimento do bebé, saber aplicar estratégias de estimulação e conhecer os sinais de alerta que indiquem a necessidade de recorrer a uma instituição de saúde;
  • Conhecer os diferentes tipos de choro do bebé e estratégias para promover um ambiente favorável ao sono e ao conforto;
  • Ter informação sobre segurança e prevenção de acidentes no recém-nascido;
  • Conhecer o Programa Nacional de Vacinação e do Rastreio Precoce de Doenças Genéticas e Metabólicas após o nascimento;
  • Conhecer o Programa Nacional de Saúde Infantil e Juvenil e compreender os benefícios do cumprimento das consultas de vigilância que estão previstas;
  • Saber transportar um recém-nascido em segurança, nomeadamente em viatura automóvel;
  • Compreender as vantagens da amamentação para mãe e bebé;
  • Adquirir estratégias de promoção, apoio e manutenção do aleitamento materno;
  • Saber reconhecer sinais de que a amamentação está a correr bem ou, pelo contrário, sinais de que existem problemas ou dificuldades que podem precisar de apoio e saber quando e como recorrer a esse apoio;
  • Perceber porque se deve evitar oferecer tetinas e chupetas até a amamentação estar bem estabelecida;
  • Saber que cuidados devem existir na alimentação da mulher durante a amamentação;
  • Compreender as alterações físicas e emocionais que ocorrem no pós-parto e adquirir estratégias que promovam uma melhor adaptação a esta fase;
  • Perceber com decorre a recuperação física pós-parto e compreender aspetos como o retomar da atividade sexual ou o retorno à fertilidade pós-parto, a importância de haver um espaçamento entre gravidezes e ter conhecimento de possíveis métodos contracetivos durante o aleitamento materno;
  • Preparar o regresso ao trabalho atempadamente e saber como conciliar com o aleitamento materno;
  • Compreender a importância da rede de suporte e a partilha com outros pais.

Estes são alguns dos principais pontos que nos podem orientar sobre que informações e conhecimentos são importantes adquirirmos no âmbito da preparação para o parto.

O mais importante será sempre que cada grávida e/ou casal procure aquilo que mais se adequa às suas necessidades. Não é obrigatório frequentar um curso de preparação para o parto, se isso não fizer sentido. A informação pode ser encontrada por outras vias, embora os cursos tenham a vantagem de ter a informação sintetizada e organizada, além de responderem a orientações da Direção-Geral de Saúde (DGS), mais uniformizadas. Adicionalmente, têm a vantagem do grupo, permitindo o contexto e a partilha com outras grávidas e casais.

No entanto, o que é fundamental é encontrarmos a forma de nos informarmos, empoderarmos e prepararmos que para nós faça sentido, seja ela qual for, e o nível de conhecimento e informação que queremos, ou não queremos, ter.

Como em tudo, o respeito e a autodeterminação são elementares. A preparação para o parto será tanto melhor quanto mais me ajudar a sentir confiante e preparada, naquilo que é a minha vontade e naquilo que faz sentido para mim!

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